Visão da Curadoria
A 2ª Mostra Taturana de Cinema: Democracia e Antirracismo, realizada em parceria com a Coalizão Negra por Direitos, Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (APAN) e Wonder Maria Filmes (Portugal), reúne curtas e longas-metragens documentais, brasileiros e de outros países, sob a premissa de que não é possível falar em democracia sem se comprometer com a luta antirracista.
Se a imagem desempenha um papel fundamental na sociedade contemporânea, para falar em democracia também é necessário descolonizar o olhar.
Da perspectiva do racismo estrutural – quando as práticas institucionais, históricas, culturais e interpessoais inferiorizam e prejudicam sistematicamente um grupo social ou étnico em benefício de outro, e isso baliza o funcionamento de uma sociedade –, as ordens imaginárias não escapam da lógica de dominação. A repetição de imagens – no cinema, na mídia, nas redes – muitas vezes torna familiar e naturaliza concepções que ajudam a construir, apoiam e mantêm opressões como racismo, sexismo, estigmatização de grupos historicamente discriminados e exterminados pela dominação de matriz colonial, que persiste no mundo globalizado de hoje.
O cinema pode ser uma ferramenta privilegiada para combater e romper com esses modelos hegemônicos de ver, pensar e representar o outro dentro de uma lógica de opressão. Ver-se em outra perspectiva, imaginar-se, descrever-se e reinventar-se pelo cinema é uma forma de descolonizar imaginários, interrogar as matrizes de representação opressoras e criar estratégias para a construção de outras, que em vez de reduzir, multiplicam as possibilidades de existência na ideia de diversidade.
É com esse olhar que a curadoria da Mostra selecionou 23 filmes dirigidos apenas por pessoas negras e indígenas e organizou 11 atividades (debates, encontros, oficinas e mais) relacionadas às questões abordadas pelas obras.
Os filmes e as atividades estão organizados em seis eixos temáticos: Experiências do corpo e da fé: religiosidade, estética e antirracismo; Em defesa da vida: direito ao território e ao modo de viver; Árvore da memória: busca da ancestralidade e combate ao apagamento e à invisibilidade; Muros do racismo: estruturas e fronteiras geográficas, materiais e simbólicas; Vidas negras importam: violência de Estado e genocídio da população negra; Outras histórias possíveis: memória, vozes e disputa de narrativas.
A Mostra abre, ainda, uma conexão direta com Portugal: parte da programação está pensada especificamente para estabelecer diálogos com este país de histórico colonizador e, respeitadas as diferenças, promover debates sobre temas e entre pessoas a partir de pontos em comum. Assim, filmes de realizadores que trazem histórias vividas no continente africano e nas diásporas, em países como Angola, Guiné e Quênia, além de Portugal, somam-se à programação do encontro, proposto como espaço de diálogo e comprometimento.
A Mostra acontece nos dois países de 14 a 19 de setembro, semana em que se celebra o Dia Internacional da Democracia. Os documentários têm acesso gratuito pela plataforma TodesPlay (tanto para Brasil quanto para Portugal), por onde também serão transmitidos debates e outras atividades online com pessoas convidadas. Acontecem, ainda, algumas atividades presenciais em ambos países; destaque especial para as caminhada históricas pelos centros de São Paulo e Lisboa, revisitando lugares de presença africana nessas cidades. Em São Paulo, a programação presencial acontece no Centro Cultural São Paulo (CCSP) e no Centro de Formação Cultural Cidade Tiradentes. Em Lisboa, acontece no Museu do Aljube – Resistência e Liberdade. Em todos os locais presenciais, o público será reduzido e haverá protocolos de segurança.